LER É BACANA

" Um público comprometido com a leitura é crítico, rebelde, inquieto, pouco manipulável... " Mario Vargas Llosa















28 de ago. de 2011

A Segunda Fase do Modernismo - (1930-1945) Poesia



Um Rico Período de Construção

Abandonando o espírito destrutivo e irreverente dos primeiros momentos do Modernismo, a poesia, a partir de 1930 mais ou menos, apresenta um gradual amadurecimento.
Aproveitando a liberdade estética conquistada e elaborando uma linguagem pessoal, os poetas da segunda fase desenvolvem plenamente suas tendências próprias sem a preocupação de chocar ou agredir o público tradicionalista.
É o momento em que se afirma uma das nossas melhores gerações de poetas: Cecília Meireles, Vinícius de Moraes, Carlos Drummond de Andrade, Augusto F. Schmidt, Henriqueta Lisboa, Murilo Mendes, Jorge de Lima, Dante Milano, Mário Quintana, Joaquim Cardozo entre outros. Alguns poetas da época anterior se renovam, como é o caso, por exemplo, de Mário de Andrade e Manuel Bandeira.
Ampliando seus temas, a poesia dessa fase desenvolve-se em várias linhas — social, religiosa, espiritualista, amorosa —, indicando novos rumos e marcando definitivamente a presença da poesia moderna no Brasil.

  "Este é tempo de partido, / tempo de homens partidos. (...) Os homens pedem carne. Fogo. Sapatos. / As leis ano bastam. Os lírios ano nascem da lei. Meu nome é tumulto, e escreve-se / na pedra." (Carlos Drummond de Andrade, in Nosso Tempo)

Características
•Repensar a historia nacional com humor e ironia - " Em outubro de 1930 / Nós fizemos — que animação! — / Um pic-nic com carabinas." (Festa Familiar - Murilo Mendes)
•Verso livre e poesia sintética - " Stop. / A vida parou / ou foi o automóvel?" (Cota Zero, Carlos Drummond de Andrade)
•Nova postura temática - questionar mais a realidade e a si mesmo enquanto indivíduo
• Tentativa de interpretar o estar-no-mundo e seu papel de poeta
• Literatura mais construtiva e mais politizada.
• Surge uma corrente mais voltada para o espiritualismo e o intimismo (Cecília, Murilo Mendes, Jorge de Lima e Vinícius)
• Aprofundamento das relações do eu com o mundo
• Consciência da fragilidade do eu - "Tenho apenas duas mãos / e o sentimento do mundo" (Carlos Drummond de Andrade - Sentimento do Mundo)
• Perspectiva única para enfrentar os tempos difíceis é a união, as soluções coletivas - " O presente é tão grande, ano nos afastemos, / Ano nos afastemos muito, vamos de mãos dadas." (Carlos Drummond de Andrade - Mãos dadas)

Carlos Drummond de Andrade  >>   Nasceu em Itabira-MG, em 1902, Filho de proprietários rurais arruinados, estudou em Belo Hori-zonte, diplomou-se em Farmácia, deu aulas de Geogra-fia, exerceu o Jornalismo e foi funcionário público. Em 1933, radicou-se definitivamente no Rio de Janeiro. Morreu em 1987. É considerado maior poeta brasileiro.
A poesia de Carlos Drummond de Andrade pode ser abordada a partir da dialética “eu x mundo”.
Ironia fina, lucidez, e calma, traduzidos numa linguagem flexível, rica, mas rica de dimensões humanas.

Poesias refletem os problemas do mundo e do ser humano diante dos regimes totalitários, da 2a GM e da guerra fria.

Poesia de Drummond apresenta uns momentos de esperança, mas prevalece a descrença diante do rumo dos acontecimentos.

Nega formas de fuga da realidade, volta-se para o momento presente.

  "Ano serei o poeta de um mundo caduco. / Também ano cantarei o mundo futuro. / Estou preso `a vida e olho meus companheiros. (...) O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes, / a vida presente."
  
  --Mãos Dadas 

A partir de Lição das Coisas (1962), há maior preocupação maior com objetos, valorizando mais os aspectos visuais e sonoros - tendência concreto-formalista.

Carlos Drummond de Andrade propõe a divisão temática de sua obra, numa seleção que faz para sua Antologia Poética:

1.o indivíduo
2.a terra natal
3.a família
4.os amigos
5.o choque social
6.o conhecimento amoroso
7.a própria poesia
8.exercícios lúdicos
9.uma visão, ou tentativa de, da existência

Obras:

•Poesia: ◦Alguma Poesia (1930) ◦Brejo das Almas (1934)
◦Sentimento do Mundo (1940) ◦Poesias (1942) ◦A Rosa do Povo (1945) ◦Poesia até agora (1948) ◦Claro Enigma (1951)
◦Viola de Bolso (1952)◦Fazendeiro do Ar e Poesia até Agora (1953)◦Viola de Bolso Novamente Encordoada (1955)
◦Poemas (1959)◦A Vida Passada a Limpo (1959)
◦Lição de Coisas (1962)◦Versiprosa (1967) ◦Boitempo(1968) ◦Menino Antigo (1973) ◦As Impurezas do Branco (1973)
◦Discurso da Primavera e outras Sombras (1978)

•Prosa:
◦Confissões de Minas (ensaios e crônicas, 1944)
◦Contos de Aprendiz (1951)
◦Passeios na Ilha (ensaios e crônicas, 1952)
◦Fala, Amendoeira (1957)
◦a Bolsa e a Vida (crônicas e poemas, 1962)
◦Cadeira de Balanço (crônicas e poemas, 1970)
◦O Poder Ultrajovem e mais 79 Textos em Prosa e Verso (1972)

Carlos Drummond de Andrade é considerado um dos maiores poetas brasileiros (1902 - 1987),  também cronista, contista e tradutor. Entre suas obras de maior destaque, Alguma poesia, Sentimento do mundo e        A rosa do povo.

Alguns poemas de Drummond

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José ?
e agora, você ?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama protesta,
e agora, José ?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José ?

E agora, José ?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio - e agora ?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora ?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse…
Mas você não morre,
você é duro, José !

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José !
José, pra onde ?

Poema de sete faces

Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.

Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.
No Meio do Caminho
      No meio do caminho tinha uma pedra
      tinha uma pedra no meio do caminho
      tinha uma pedra
      no meio do caminho tinha uma pedra.
      Nunca me esquecerei desse acontecimento
      na vida de minhas retinas tão fatigadas.
      Nunca me esquecerei que no meio do caminho
      tinha uma pedra
      tinha uma pedra no meio do caminho
      no meio do caminho tinha uma pedra.

Quadrilha
      João amava Teresa que amava Raimundo
      que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
      que não amava ninguém.
      João foi para o Estados Unidos, Teresa para o convento,
      Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
      Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
      que não tinha entrado na história.


As Sem-razões do Amor

Eu te amo porque te amo.
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.
Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.
Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.
Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.



Murilo Mendes (1902-1975)
Mineiro, que caminha das sátiras e poemas-piada, ao estilo oswaldiano, para uma poesia religiosa, sem perder o contato com a realidade. Poeta modernista mais infuenciado pelo Surrealismo europeu.

Guerra foi tema de diversos poemas seus. Seus textos caracterizam-se por novas formas de expressão, e livre associação de imagens e conceitos.

A partir de Tempo e Eternidade (1935), parte para a poesia mística e religiosa. Dilema entre poesia e Igreja, finito e infinito, material e espiritual, sem abandonar a dimensão social.

  "Eu amo minha família sobrenatural, / Aquela que ano herdei, / Aquela que ama o Eterno. / São poetas, são musas, são iluminados / Que vivem mirando os seus fins transcendentes. / Que vivem mirando os seus fins transcendentes. / 'o mundo, minha família sobrenatural ano te possuiu. / Minha angústia vive nela e com ela, / E eu formarei poetas no futuro / `A sua imagem e semelhança. E todos ajuntando novos membros ao corpo / De que Cristo Jesus é a cabeça / Irradiarão as palavras do Eterno."
  
  --communicantes 

Também é poeta especulador, que usa a linguagem em busca de novos conceitos.

  "O poema é texto? O poeta? / O poema é o texto + o poeta? / O poema é o poeta - o texto? / O texto é o contexto do poeta / Ou o poeta do contexto do texto? / O texto visível é o texto total / O antetexto e o antitexto / Ou as ruínas do texto? / O texto abole / Cria / Ou restaura?"
  
  --Texto de Consulta 

Essa condição barroca de sua poesia associa-se a um trabalho das imagens visuais. Empolgado com a beleza, afirmava que tudo era belo pois pertencia `a Criação. Só as ações humanas justificavam o feio.

Consciência do caos, do mundo esfacelado, civilização decadente. Trabalho do poeta é tentar ordenar esse caos.

  " (...) A infância vem da eternidade. / Depois só a morte magnífica / — Destruição da mordaça: / E talvez já' a tivesse entrevisto / Quando brincavas com o pião / Ou quando desmontaste o besouro. Entre duas eternidades / Balançam-se espantosas / Fome de amor e a música: / Rude doçura / 'Ultima passagem livre. Só vemos o céu pelo avesso."
  
  --Poesia de Liberdade 

Para Murilo, a beleza é fundamental. Mulher, para Murilo, éigual a amor, abordada de forma erótica.

  "Tudo o que te rodeia e te serve
Aumenta a fascinação, o segredo
Teu véu se interpõe entre ti e meu corpo,
é a grade do meu cárcere. (...)
Tudo o que faz parte de ti —  desde teus sapatos —
Está unido ao pecado e ao prazer,
`A teologia, ao sobrenatural."
  
  --Em Pânico, in Antologia Poética 

Obras : Poemas (1930), História do Brasil (1932), Tempo e Eternidade (com Jorge de Lima, 1935), A Poesia em Pânico (1938), O Visionário (1941), As Metamorfoses (1944), O Discípulo de Emaús (prosa, 1944), Mundo Enigma, (1945), Poesia Liberdade (1947), Janela do Caos (1948), Contemplação de Ouro Preto (1954), Poesias (1959), Tempo Espanhol (1959), Poliedro (1962), Idade do Serrote (Memórias, 1968), Convergência (1972), Retratos Relâmpago (1973), Ipotesi (1977)

Jorge de Lima (1898-1953)
Alagoano ligado diretamente à política, estréia com a obra XVI Alexandrinos fortemente influenciado pelo Parnasianismo, o que lhe deu o título de Príncipe dos Poetas Alagoanos. Sua obra posteriormente chega a uma poesia social, paralela a uma poesia religiosa.

Na poesia social apresenta-se a cor local, através do resgate da memória do autor de menino branco com infância cheia de imagens de negros escravos e engenhos. Por vezes, amplia a abordagem com denúncia das desigualdades sociais.

  “A filha de Pai João tinha um peito de / Turina para os filhos de Ioiô mamar: / Quando o peito secou a filha de Pai João / Também secou agarrada num / Ferro de engomar. / A pele de Pai João ficou na ponta / Dos chicotes. / A força de Pai João fìcou no cabo Da enxada e da foice. / A mulher de Pai João o branco / A roubou para fazer mucamas."
  
  --Pai João 

A partir de Tempo e Eternidade, há a preocupação da restauração da Poesia em Cristo. Essa temática religiosa também está presente em A Túnica Inconsútil e Mira Coeli.

Tem ainda um poema épico à moda de Camões e Dante, usando 10 cantos para mostrar o dilema barroco de um homem indeciso entre o material e o espiritual.

  Mulher Proletária

Mulher proletária - única fábrica
que o operário tem, (fabrica filhos)
 tu
na tua superprodução de máquina humana
forneces anjos para o Senhor Jesus,
forneces braços para o senhor burguês.

Mulher proletária,
0 operário, teu proprietário
há de ver, há de ver:
a tua produção,
a tua superprodução,
ao contrário das máquinas burguesas
salvar o teu proprietário.
  
  --Poesias, 1975 

Obras:

•Poesia - XIV Alexandrinos (1914), O Mundo do Menino Impossível (1925), Poemas (1927), Novos Poemas (1929), Poemas Escolhidos (1932), Tempo e Eternidade (em colaboração com Murilo Mendes, 1935), Quatro Poemas Negros (1937), A Túnica lnconsútil (1938), Poemas Negros (1947), Livro de Sonetos (1949), Obra Poética (incluindo os anteriores e mais Anunciação e Encontro de Mira-Celi), 1950), Invenção de Orfeu (1952)

•Romance - Salomão e as mulheres (1927), O Anjo (1934), Calunga (1935), A Mulher Obscura (1939), Guerra Dentro do Beco (1950)

•Teatro - A Filha da Mãe D'Água, As Mãos, Ulisses

•Cinema - Os Retirantes (argumento de filme)

Cecília Meireles

Órfã, carioca, foi criada pela avó e fez Magistério e lecionou Literatura em várias universidades.

Estréia com o livro Espectros (1919), participando da corrente espiritualista, sob a influência dos poetas que formariam o grupo da revista Festa (neo-simbolista).

Suas principais características são sensibilidade forte, intimisno, introspecção, viagem para dentro de si mesma e consciência da transitoriedade das coisas (tempo = personagem principal). Para ela as realidades não são para se filosofar, são inexplicáveis, basta vivê-las.

  Retrato

Eu não tinha este rosto de hoje, / assim calmo, assim triste, assim magro, / nem estes olhos tão vazios, / nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força, / tão paradas e frias e mortas; / eu não tinha este coração / que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança, / tão simples, tão certa, tão fácil:

- Em que espelho ficou perdida

a minha face?
  
  --Flor de Poemas 

Assim sua obra apresenta uma atmosfera de sonho, fantasia,em contraste com solidão e padecimento. Linguagem simbólica, com imagens sugestivas e constantes apelos sensoriais (metáforas, sinestesias, aliterações e assonâncias).

  Rômulo rema

Rômulo rema no rio. / A romã dorme no ramo, / a romã rubra. (E o céu.)
O remo abre o rio. / O rio murmura,
A romã rubra dorme / cheia de rubis. (E o céu.)
Rômulo rema no rio.
Abre-se a romã. / Abre-se a manhã.
Rolam rubis rubros do céu.
No rio, / Rômulo rema.
  
  --Ou isto ou aquilo 

Obras:

•Poesia : Espectros (1919), Nunca mais... e Poema dos Poemas (1923), Baladas para EI-rei (1925), Viagem (1939), Vaga Música (1942), Mar Absoluto (1945), Retrato Natural (1949), Ama em Leonoreta (1952), Doze Noturnos de Holanda e o Aeronauta (1952) Romanceiro da Inconfidência (1953), Pequeno Oratório de Santa Clara (1955) Pistóia, Cemiério Militar Brasileiro (1955) Canções (1956), Romance de Santa Cecília (1957), A Rosa (1957), Metal Rosicler (1960), Poemas Escritos na Índia (1962) Antologia Poética (1963) Solombra (1963), Ou isto ou Aquilo (1965), Crônica Trovada da Cìdade de San Sebastian (1965) Poemas Italianos (1968)

•Teatro : O Menino Atrasado (1966)

•Ficção : Olhinhos de Gato (s/d)

•Prosa poética : Giroflê, Giroflá (1956), Evocação Lírica de Lisboa (1948) Eternidade de Israel (1959)

•Crônica : Escolha o seu Sonho (1964) Inéditos (1968)


Vinícius de Moraes
Carioca conhecido como Poetinha, participou também da MPB desde a Bossa-nova até sua morte. Assim como Cecília, inicia sua carreira ligado ao neo-simbolismo da corrente espiritualista e também a renovação católica de 30.

Vários de seus poemas apresentam tom bíblico, mas há, concomitantemente, um sensualismo erótico. Essa dualidade acentua a contradição entre o prazer da carne e a formação religiosa. Valoriza o momento com presença de imediatismos (de repente constante). Temática constante o jogo entre felicidade e infelicidade, onde muitas vezes associa a inspiração poética com a tristeza, sem abandonar o social.

  “É melhor ser alegre que ser triste / A alegria é a melhor coisa que existe / É assim como a luz no coração”
  
  --Samba da Bênção 

  “Para que vieste / Na minha janela / Meter o nariz? / Se foi por um verso / Não sou mais poeta / Ando tão feliz.”
  
  --A um Passarinho 

Obras:

•Poesia: O Caminho para a Distância (1933), Forma e Exegese (1935), Ariana, a Mulher (1936), Novos Poemas (1938), Cinco Elegias (1943), Poemas, Sonetos e Baladas (1946), Pátria Minha (1949), Livro de Sonetos (1956), O Mergulhador (1965), A Arca de Noé (1970), O Dever e o Haver (inédito)

•Teatro: Orfeu da Conceição (Tragédia carioca em três atos, escrita em versos, 1954), Cordélia e O Peregrino (em versos, 1965), Pobre Menina Rica (comédia musicada, 1962), Chacina de Barros Filho (drama, inédito)

•Prosa: Reportagens Poéticas (inéditas em livro), O Amor dos Homens (crônicas, 1960), Para viver um Grande Amor (crônicas, 1962), Para uma menina com uma Flor (crônicas, 1966), Crônicas (in J. B. de 15/6/69 a 20/10/69)


  
  --Murilo Mendes 

  Elegia a uma pequena borboleta

Como chegavas do casulo, / — inacabada seda viva — / tuas antenas — fios soltos / da trama de que eras tecida, / e teus olhos, dois grãos da noite / de onde o teu mistério surgia,
como caíste sobre o mundo / inábil, na manhã tão clara, / sem mãe, sem guia, sem conselho, / e rolavas por uma escada / como papel, penugem, poeira, / com mais sonho e silêncio que asas,
minha mão tosca te agarrou / com uma dura, inocente culpa, / e é cinza de lua teu corpo, / meus dedos, sua sepultura. / Já desfeita e ainda palpitante, / expiras sem noção nenhuma.
Ó bordado do véu do dia, / transparente anêmona aérea! /não leves meu rosto contigo: / leva o pranto que te celebra, / no olho precário em que te acabas, / meu remorso ajoelhado leva! (...)
Pudeste a etéreos paraísos / ascender teu leve fantasma, / e meu coração penitente ser a rosa desabrochada / para servir-te mel e aroma, / por toda a eternidade escrava!
E as lágrimas que por ti choro / fossem o orvalho desses campos, / — os espelhos que refletissem / — vôo e silêncio — os teus encantos, / com a ternura humilde e o remorso / dos meus desacertos humanos!
(Retrato Natural)
  


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Fragmentos de Procura da Poesia, in A Rosa do Povo

Ano facas versos sobre acontecimentos.
Ano ha' criação nem morte perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático,
ano aquece nem ilumina. (...)
Nem me reveles teus sentimentos,
que se prevalecem do equívoco e tentam longa viagem.
O que pensas e sentes, isso ainda ano é poesia. (...)
O canto ano é  a natureza
nem os homens em sociedade.
Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança, nada significam.
A poesia (ano tires poesia das coisas)
elide sujeito e objeto. (...)
Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas ano há desespero,
há calma e frescura na superfície inata
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com teus poemas, antes de escreve-los.
Tem paciência, se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silencio.
Ano forces o poema a  desprender-se do limbo.
Ano colhas no chão o poema que se perdeu.
Ano adules o poema. Aceita-o
como ele aceitara' a sua forma definitiva e concentrada no espaço.

Chega perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave? (...)
  
  --Carlos Drummond de Andrade 

  Canção do Exílio

Minha terra tem macieiras da Califórnia
Onde cantam gaturamos de Veneza.
Os poetas da minha terra
são pretos que vivem em torres de ametista,
os sargentos do exército são monistas, cubistas
os filósofos são polacos vendendo a prestações.
A gente ano pode dormir
com os oradores e os pernilongos.
Os sururus em família têm por testemunha a Gioconda.
Eu morro sufocado
em terra estrangeira.
Nossas flores são mais bonitas
nossas frutas mais gostosas
mas custam cem mil réis a dúzia

Ai quem me dera chupar uma carambola de verdade
e ouvir um sabiá com certidão de idade!